Quantas vezes?

Jesus constitui um grupo de discípulos ou seja, de aprendizes que deverão fazer a experiência de aprender a proposta do Reino a partir da convivência e relacionamento com o Mestre. Num modelo peripatético essa escola não parte dos conteúdos para ensinar, mas sim da observação e experiência do dia a dia da missão, os seguidores farão a descoberta do que é proposto por Jesus e serão chamados a aplicar isso em suas vidas e missão.

Por isso Jesus não escreveu nenhum compêndio.

Agora imaginem você a dificuldade que deve ter sido o entendimento daquelas pessoas quando percebem que tudo o que haviam aprendido na sua cultura religiosa precisava ser lapidado... e isso nos rendeu vários e belos textos do Evangelho.

Um desses textos lemos hoje na nossa meditação diária (Mt 18, 21- 19, 1).

Uma pergunta de retórica é feita por Pedro: QUANTAS VEZES DEVO PERDOAR. ATÉ SETE VEZES...

Para ele que estava no grupo do caminho, peregrinando por sua terra e aprendendo a missão, ao perguntar e responder sobre a quantidade de vezes a perdoar pensa já ter aprendido muito.

Não nos esqueçamos que eram formados na lei do Talião, do olho por olho e do dente por dente. E portanto, perdoar sete vezes já seria um avanço extraordinário.

Mas a escola de Jesus propõe sair da contabilidade das ações. Sete vezes é bom mas se trata ainda de quantificar a chance de reaprender e reavaliar as relações humanas. É preciso mais e Jesus vai propor um novo paradigma que foge ao numérico e nos molda ao que Deus faz.

Setenta vezes sete é muito mas, na simbologia da cultura judaica, é sempre...

Resultado de imagem para perdoar setenta vezes sete

Jesus não amplia o número de vezes que devemos perdoar a um número qualquer. Quer que pensemos no significado do perdão como uma prática constante que nos aproxima do Pai. E por isso mesmo já emenda outra parábola dizendo que o perdão que pedimos e sempre recebemos do Pai não pode ser condicionado a um número ou ao interesse que temos em dar o perdão para os outros.

Vejamos que se trata de aprofundar o conhecimento sobre Deus: Perdoa sempre...

Mas se trata também de aprender sobre o caminho da vida cristão: o perdão tem consequências práticas para quem quer ser discípulo: a necessidade de sempre dar o perdão significa a vontade de se aproximar do mistério misericordioso que envolve Deus.

Daí a novidade da proposta de Jesus.

O perdão que pedimos sempre a quem devemos (seja Deus ou as outras pessoas) e que esperamos sempre receber indica que devemos aprender a dar como resultado da escolha que fazemos em ser de Deus e se aproximar daquilo que move o coração de Deus.

Não é à toa que rezamos todos os dias: PERDOAI AS NOSSAS OFENSAS ASSIM COMO PERDOAMOS A QUEM NOS TENHA OFENDIDO...

Não é à toa que isso gera em nós certo desconforto porque queremos discutir o fato de que perdoar sempre significa ser bobo de quem erra sempre com a gente...

Não é.

Perdoar não significa dizer que o que o outro nos fez não tem problema e fazer de conta que superamos isso.

Perdão é caminho. Às vezes são necessários anos para que se perdoe de fato.

Mas perdoar significa principalmente que não queremos ficar aprisionados ao erro cometido ou sentido. Não queremos viver o resto dos dias cutucando uma ferida só pelo prazer de sentir dor. Não queremos cobrar do outro mais do que ele possa dar.

Por isso perdão é tão salutar.

Primeiro porque nos dá o direito de dizer se queremos viver escravos do erro (nosso ou dos outros).

Mas também perdão significa dizer sobre o que está fundada nossa experiência humana: na perfeição intocada e disfarçada das relações onde tudo é perfeito e quando não o é, se rompe ou então, na singeleza do barro que somos que se quebra e trinca mas que com a mão do oleiro é capaz de se refazer e seguir adiante querendo viver a alegria de cada dia, sem amarras ou prisões.

Daí nossa gratidão por tanto amor que o Pai tem por nós...

Não se cansa de perdoar não porque é bobo ou fraco. Mas porque acredita, aposta e quer que a gente tenha a possibilidade de fazer diferente. E se pensarmos bem, é nisso que se estrutura nossa compreensão mais generosa daquilo que Deus é....

Daí nossa necessidade de ir além do Talião, das sete vezes... e chegarmos ao sempre. Porque sabemos que os erros não são para criar ruptura mas para abrir possibilidade de recomeço.

Confesso, nem sempre é fácil de pensar e aceitar e viver essas coisas.

Mas necessário é...

Fiquem bem. 

Comentários

  1. Perdão é caminho... que lindo! Nesse caminho por vezes acredito ser mais difícil perdoar-se do que fazer isso ao próximo. Mas seguimos tentando... Abçs!

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  2. Nem sempre é fácil perdoar,mas como Deus nos ensinou : é necessário,.isso é amor!!!

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  3. Bom dia ! Não sei se dá pra eu falar que é o texto `melhor´que li.....pois, acho todos muito bem elaborados, mas hoje esse veio na medida e hora certa para mim. Tenho pensado muito no
    perdão, como superar a mágoa, e lendo tudo isso entendi que não é só pra mim que aparece certas dificuldades ( pq tem dias que sou tãão lei de Talião) O perdão é DIVINO por isso temos dificuldades de colocá-lo no coração constantemente..... novamente sobre o texto, vou reler já..já...abraço padre.Muito grata

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  4. Li em um texto do Prof. Felipe Aquino que fala sobre a força transformadora do perdão. Nele ele cita uma frase de Gandhi que, embora não trate diretamente do perdão nos ensina a grandeza do não revidar: "Procuro amassar completamente a ponta da espada do tirano: não oponho um aço mais afiado, e assim ludibrio sua esperança de ver-me oferecer uma resistência física. Encontrará em mim uma resistência de alma que escapa a seu cerco".

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