O MAR, O MUNDO E A CORAGEM
Os evangelistas tinham uma capacidade extraordinária para escrever as estórias que a comunidade ia contando e que sentia a necessidade de preservar fazendo memoria definitiva. Isso ajudou as comunidades cristãs a se estruturar mas também a aprofundar a fé a partir da leitura e meditação desses textos que chamamos de sagrados.
Mas convenhamos: tem que ser habilidoso e tem que ter o recurso da fé também onde o Espírito ajuda a depurar e explicitar esses eventos. Por isso reverenciamos esse dom na vida da Igreja.
O texto que meditamos no dia de hoje ( Mt 14, 22- 36) é um belíssimo exemplo do que falei acima.
Nem sei se damos conta de meditar tantos elementos que nele encontramos e nem sei se os que pregam, conseguimos fazer chegar à essência do texto.
Mas vamos juntos:
Estamos numa cena em que a multidão acaba de comer...
Jesus organiza a partida dos discípulos na BARCA enquanto Ele ainda ficará com a multidão para despedi-la. A barca é imagem da Igreja, do espaço em que vão permanecer juntos para a missão, do ir adiante. Despedir a multidão é um gesto de afeto, de carinho e de atenção.
Veja que a barca (= igreja) tem destino: o outro lado do mar: a missão da igreja não é ficar restrita ou especificamente num lado do mundo (=mar).
Jesus também tem o seu espaço de silêncio, de prece, de encontro com o Pai. Enquanto a Igreja segue, a multidão descansa, Ele vai orar...
Mas o mar (=mundo) não anda nada calmo. Tem ondas que agitam a barca e dificulta a navegação. Alguém duvida que essa imagem diz respeito a tudo o que fazemos na Igreja? Navegar não é uma calmaria. Assumir a missão significa enfrentar os banzeiros.
No meio da cansaço da missão e do medo da força das ondas, os discípulos (nós) acabamos por confundir tudo e misturar a visão. Achamos que nada que esteja no mundo (nas ondas) presta e às vezes não enxergamos que é no meio dessas dificuldades que está Jesus, andando sobre as ondas...
Apavorados que somos, gritamos que é fantasma, que é o diabo, que é assombração, que é coisa que não devia existir... Se tivessem uma arma, matariam para se defender. Se temos possibilidade julgamos, criticamos, destruímos o que nos ameaça com a força da língua...
O que talvez eles e com certeza nós ainda não aprendemos é que a missão nem sempre é feita num porto seguro, ancorado no cais... Muitas vezes é no meio do temporal, da ventania, do banzeiro que somos chamados para evangelizar. Queremos águas calmas, mas o mundo anda agitado e com isso vemos medo e fuga por todo lado.
Jesus, como sempre, pede-nos coragem e consciência para reconhece-lo: sou Eu diz a eles. Sou Eu diz a nós...
Mas nossa fantasia é querer fugir e os pregadores modernos insistem em ganhar sobre isso prometendo acalmar as ventanias a qualquer custo e vencer todo desafio apresentando rotas de fuga. Esses não leram a grandeza desse texto...
Pedro (sempre ele) pede uma prova. Quer ter certeza que pode confiar e acha que andar sobre as águas é uma forma de provar que Aquele que anda não é um fantasma.
Penso que Pedro tem uma outra tentação. Quer ser igual a Jesus para se sentir diferente dos outros. Mas isso é uma outra história...
Claro que vai receber o sinal positivo de Jesus e sai andando. Mas claro também que, coo só quer provar a confiança em Deus, vai afundar... A Igreja não pode estar sobre as águas. Nós não devemos estar acima do problemas mas inseridos e dispostos a fazer o que tem que ser feito enquanto ainda se navega (se vive).
Nossa missão não é estar acima. Nosso trabalho é estar inserido. E parar de se iludir: enquanto ainda se navega (se vive) não tem como estar acima dos problemas e desafios da vida e do mundo...
Feliz de quem encontra força Nele que está acima e pode motivar, guiar, fortalecer e ajudar na travessia. Mas não podemos querer o mesmo. Enquanto vivemos e navegamos nos mares deste mundo, somos convidados a viver inseridos, comprometidos e dispostos a realizar a missão do Reino com toda a riqueza e beleza e desafios que a vida apresenta. Sem temer, sem vacilar, com confiança que mesmo que a ventania assusta (e como assusta) Ele não se afastou e nem se esqueceu de nós.
Eu creio.
Fiquem bem.
Bom dia! Inspiraduu... Lindíssima sua reflexão, motivadora. Abraço
ResponderExcluirReflexão exemplar!!!
ResponderExcluirAlguns textos da Bíblia (este é um deles) têm o poder de me transportar para o local dos acontecimentos. Gosto de meditar sobre os escritos, mas me fascina demais imaginar Jesus chegando na barca, vendo aquela multidão toda à sua espera. Fico pensando o que ele teria dito àquela gente durante o dia todo. Quais teriam sido suas palavras na hora que se despediu deles. Me intriga também saber por quê sempre sobe a um monte quando quer orar. Na verdade eu tenho muita sede de saber mais e mais sobre esse nosso Jesus.
ResponderExcluirFoi muito linda e proveitosa a celebração na Santa Clara....Grata por participar desse Tríduo!!!
ResponderExcluirNossa!!! Reflexão maravilhosaa... obrigada Padre!
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